O
deputado federal João Campos, PSDB-GO, fez um projeto de decreto para a Câmara
dos Deputados que consiste em revogar as resoluções do Conselho Federal de
Psicologia que proíbem os seus entes de tratarem a homossexualidade como doença
e a propor cura para elas. De acordo com o deputado, a medida é autoritária,
uma vez que proíbe as pessoas procurarem cura para aquilo que elas entendem
como um problema, a sua sexualidade.
No
entanto, o CFP baseia suas resoluções em ciência, que é o principio ao qual a
psicologia está imersa. Isto quer dizer, em outras palavras que quando o CFP
elaborou tais resoluções, foi levado em conta um processo pautado em método
cientifico, que em grosso modo pode ser resumido como definir um problema – o
sofrimento dos homossexuais a respeito de sua sexualidade – elencar quais são
as causas – a incompreensão e a hostilidade social a respeito da
homossexualidade, entre outras – e, portanto uma linha de ação, coisas que um
leigo como o que escreve este blog não tem conhecimento para falar como devem
ser.
Assim,
passar por cima de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, que também
está pautado na Organização Mundial de Saúde e que também segue os mesmos
princípios metodológicos, requer embasamento científico, estudos de casos
comprovados, variados, múltiplos, elaborados e reanalisados por vários
profissionais da área e que comprovem que a homossexualidade seja uma doença e depois,
outros vários estudos, nos mesmos critérios, que comprovem que ela pode ser
curada. Algo pouquíssimo provável quando os profissionais da psicologia afirmam
que todos os estudos sérios que se tem e que são publicados levam à compreensão
do contrário.
Somando-se
a isso o deputado João Campos, que tem sim autoridade para falar sobre
direitos, não tem autoridade para pedir o direito a cura da homossexualidade,
uma vez que embora seja da área do Direito ele não é um profissional da área da
saúde para poder falar em cura, muito menos da Psicologia, Psiquiatria, entre
outras especialidades, para poder definir a homossexualidade como doença. Nem
mesmo pelo fato de o deputado levar em conta a opinião de pessoas como a
psicóloga cristã Marisa Lobo ele pode se pensar assim.
Por
quê? Conforme analises de discursos que foram publicadas na internet por outros
psicólogos, profissionais com a mesma opinião de Marisa Lobo não mostram
estudos sérios que comprovem a ideia (talvez por que eles não existam?). E suas
soluções não acabam com a homossexualidade. Na verdade propõe um comportamento
que reprima essa sexualidade e repita atitudes de heterossexuais, o que é
equivocado uma vez que a sexualidade não é apenas um conjunto de comportamento,
logo a homossexualidade continua lá como a água fica em uma panela de pressão.
Além
desses fatores, está pesando contra a propriedade com que Marisa Lobo e
profissionais afins tratam o tema, está o fato dela se denominar psicóloga
cristã, o que quer dizer na opinião dela um profissional de psicologia que orienta
sua atuação profissional de acordo com os seus preceitos religiosos, o que é
absurdo. Embora seja verdade que pessoas ao redor do mundo conduzem suas vidas
conforme a fé que professam, assim também como não existe problema nisso, desde
que tal conduta esteja limitada a própria vida daquela pessoa.
No
entanto no caso de psicólogos cristãos o problema reside em outro lugar. Como esse
profissional representa e tem a autoridade de uma ciência, a Psicologia, seus
trabalhos têm que ter o mesmo valor em qualquer lugar do mundo, uma vez que o
conhecimento é algo universal. Porém a religião que possuem não é algo
universal, embora pense que seja. O que um cristão acredita como sendo
verdadeiro não é o mesmo para um budista ou um judeu, às vezes nem mesmo para
outro cristão. Por fim, a religião é algo pessoal, ser cristão é algo pessoal
do psicólogo. Assim sendo não deve ser estendido ao universo pessoal do seu paciente,
o que é antiético e que se fosse para ser assim não haveria a necessidade de se
existir um psicólogo para ajudar as pessoas.
Por
tais razões o projeto do deputado João Campos é um absurdo polivalente. Por
trás da intenção de João Campos não existe a defesa de direitos, tanto é que
ele é contrário ao projeto de lei da Câmara 122/06, que se aprovado criará
punições também para os crimes de ódio contra os homossexuais. O que existe é
um conchavo para a defesa de interesses comuns, uma vez que ele, a psicóloga
Marisa Lobo e vários deputados e psicólogos pelo Brasil são parte de um grupo
de evangélicos militantes, ou seja, aqueles que acreditam que todas as pessoas
devam se converter à fé que eles, seus pacientes e eleitores possuem, que as
leis, estudos e afins devam ser orientados conforme essa fé, transformando o
país em uma espécie de teocracia, sem contar os atrasados e distorções nos
avanços científicos do país.
Sendo
mais claro, o projeto passa por cima da metodologia científica, da autoridade
que somente os profissionais de uma área têm para falar sobre aquilo que
estudam e lidam, joga por baixo a autoridade de um órgão de classe, a
necessidade de se ter um curso superior e estudar a sério para receber um
título. Afinal, alguém acredita no compromisso, conhecimento e qualidade da
psicóloga Marisa Lobo? É possível acreditar nisso após visitar seu blog
(encontrado em qualquer pesquisa do Google) e ver seu português sofrível, a
fraqueza de seus argumentos, que usam mais versículos bíblicos do que exemplos
científicos reconhecidos (na verdade nenhum)? É possível acreditar na ética e
respeito existindo nela aquele jeito hostil de se referir às pessoas que
discordam dela, ainda por cima evasivo quando é um de seus pares?
É
evidente que para o bem da Ciência, da Democracia e principalmente das pessoas
isto deve ser impedido! A aprovação de projetos como abrirá precedentes para
que o Brasil continue um país cada vez mais atrasado em critérios de democracia
e conhecimento, uma vez que é factual a não interferência religiosa no
conhecimento cientifico dos países mais avançados do mundo. Também é fato que
essa famosa bancada religiosa, da qual o deputado João Campos faz parte, não
existe em países cujos direitos civis são mais abrangentes e democráticos do
que no Brasil, no qual um grupo religioso faz política para negar direito a
outros grupos em virtude de suas razões religiosas. Isto não é democracia!
Impedir
esse projeto é algo maior do que o interesse dos homossexuais brasileiros, uma
vez que este projeto e a sua justificativa é um jeito elegante de justificar e
dar outro nome à perseguição empreendida pelos setores religiosos, do qual o
autor do projeto faz parte, contra os homossexuais. Também é maior do que o
interesse do Conselho Federal de Psicologia e de seus associados. Por quê?
Primeiro,
porque uma vez aprovado projetos como este algo será factual, a intervenção
religiosa no acesso à cidadania das minorias às quais os religiosos se opõem,
neste caso os homossexuais. Futuramente, o direito das mulheres de decidirem
pelo próprio corpo, a expressão de outras minorias religiosas, enfim. Segundo,
irá desmoralizar a competência e a autoridade dos órgãos de classe, uma vez que
determinar o que eles podem fazer ou não dependerá somente da vontade dos
parlamentares inspirados no mais puro de suas ignorâncias, prepotências e
egocentrismo. Um preço que logo a Ordem dos Advogados do Brasil, conselhos de
Medicina, Odontologia, Engenharia, entre outros terão que pagar.